‘Watchmen’ é uma daquelas produções que você quer muito assistir, ao mesmo tempo que tem muito medo do que a nova história pode provocar na obra original. Entretanto, logo no primeiro episódio, é possível perceber que vale a pena uma nova abordagem, na verdade, uma continuação.
A história se passa anos após a história original de Alan Moore e temos as consequências após a lula gigante de Ozymandias aparecer em Nova York. Acompanhamos Angela Abar (Regina King), uma policial negra, investigar o assassinato de um de seus colegas sob o codinome de ‘’Sister Night’’ pois policiais agora trabalham mascarados, protegendo suas identidades e consequentemente de suas famílias, ao mesmo tempo em que vigilantes são proibidos.
A produção da HBO, encabeçada por Damon Lindelof (Lost e The Leftovers), homenageia enquanto capta a essência dos quadrinhos e traz para os dias atuais. Numa sociedade em que policiais atacam pessoas negras como bem entendem, sociedade em que supostos ativistas, para não dizer criminosos, fazem passeatas que claramente remetem a KKK, a supremacia branca se mostra tão presente e violenta, a série Watchmen se mostra necessária e urgente. Uma continuação da obra de Alan Moore não poderia ignorar os problemas expostos de nossa sociedade, nossos medos e ambições. Se antes a história refletia a guerra entre EUA e Rússia, o foco agora é outro: o ressurgimento de grupos supremacistas brancos nos EUA e como eles estão no poder mais do que imaginamos.
Personagens da obra original participam da história, mas não roubam a cena: Laurie Blake (Jean Smart), Adrian Veidt (Jeremy Irons) têm papéis essenciais, e claro, é maravilhoso vê-los novamente, mas é a vez de Angela Abar brilhar, a série se rodeia da obra original mas consegue andar sozinha muito bem. Personagens brilhantes como a própria Angela, Lady Trieu (Hong Chau), Looking Glass (Tim Blake Nelson) e Cal (Yahya Abdul Mateen II) poderiam muito bem estar presentes na criação de Moore, não fossem os limites da época. Elementos dos quadrinhos estão presentes, mas não o suficiente para ser nostálgico.
Questionamentos também seguem presentes, com a figura de Dr. Manhattan como centro. Como a existência de uma figura semelhante a Deus permite tantas tragédias, sendo até mesmo participante da guerra entre EUA e Vietnã? A moral de Rorschach e sua máscara evoluem para a KKK, chamada de Sétima Cavalaria, a qual é justamente o assunto mais abordado na história, com destaque para o episódio ‘’This Extraordinary Being’’, policiais usam máscaras e codinomes para exercer seu trabalho e utilizam de métodos questionáveis para investigar. É um mundo em resposta aos acontecimentos da HQ, com seus próprios desdobramentos, mas que se pararmos para pensar, não é assim tão diferente do mundo que vivemos.
Regina King e Jeremy Irons estão excepcionais em seus papeis. King apresenta uma personagem profunda e motivada, já Irons coloca toda a dose de ego, sarcasmo e excentricidade que Ozzymandias merece.
O episódio final, ‘’See how they fly’’, foi mais corrido do que o esperado, não dando a devida atenção a personagens como Angela e Laurie, mas o resultado ainda é satisfatório, um final coerente que junta as pontas soltas que restavam.
No mais, vale a pena prestar atenção a personagens intrigantes como Looking Glass e Lady Trieu. Nestes dois personagens temos o que Moore pode oferecer de melhor no quadrinho.
A série consegue complementar a obra original sem alterar o que já foi escrito, propondo reflexões necessárias ao mesmo tempo em que alguém novo nesse universo conseguiria aproveitar tranquilamente a história (embora ter lido antes ajude a não ficar tão confuso os fatos do passado). É uma daquelas séries que quanto mais vezes se assiste, mais detalhes você percebe, como é normal de roteiros de Lindelof.
Nota do Crítico: 5,0 = excelente
O critério de notas é estabelecido da seguinte forma:
0,0 = péssimo
1,0 = ruim
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3,0 = bom
4,0 = ótimo
5,0 = excelente